30 de janeiro de 2016

O Infante. Daniela Viçoso (El Pep)

Estimulante coincidência esta de que o livro de que falámos, Nau negra, também da El Pep, partilhe com estoutro a possibilidade de ser vistos como “ficção historiográfica”. Todavia, a linha de ficcionalidade de O Infante é bem mais elástica do que o livro de Fernando Relvas, que se ancora na realidade do tecido histórico para reforçar as alianças éticas implicadas na sua narrativa, ao passo de que no de Viçoso o propósito seja antes o de criar um ambiente brumoso, cujas referências sejam apenas o suficientes para a partir delas despedir um feixe de associações, mas sem preocupações demasiado concretas. (Mais)

29 de janeiro de 2016

Nau negra/The Last Black Ship. Fernando Relvas (El Pep)

Finalmente temos acesso a um projecto que estava prometido há algum tempo, o qual nascera num ambiente de crowfunding não muito bem-sucedido, mas que encontrou na editora de Pepedelrey um natural veículo de concretização. Trata-se de uma narrativa de algum fôlego, desenvolvida em ambiente digital, com uma temática histórica, aberta de um modo flexível a questões contemporâneas de repensar a história, a identidade e a comunicação entre os povos. Enquadrado no breve período em que se estabeleceu um vivo comércio entre os portugueses e o Japão, entre um semi-isolamento e o édito que o refecharia ao Ocidente, Nau negra centra-se sobretudo no encontro entre dois homens: um liberto de origem africana, conhecido por Reimau, e um ronin (sem utilizar esse termo) aparente, ambos servindo duas perspectivas diferentes dos mundos que se encontram, estando os portugueses reflectidos nas facetas distorcidas e secundárias desse mesmo encontro. Na verdade, passando-se em torno de Nagasaki, em 1618, já após a tomada de poder de Tokugawa Iesayu, os decretos anti-cristãos, a chegada dos ingleses, etc., já o declínio da presença portuguesa se precipitava, tornando este encontro então num canto de cisne de um poder pouco efectivo… (Mais) 

28 de janeiro de 2016

Volcan, Komikaze # 14, Hollow, Ping-Pong. Amanda Baeza, outros artistas (várias editoras)

Como introdução ao “campo específico” em que emergem todas estas publicações, remetemos os leitores às considerações tecidas a propósito de Mould Map e à introdução da bateria sob a designação “art comics”, a qual, não sendo explicativa nela mesma nem sequer produtiva em todos os seus quadrantes, admite porém uma circunferência suficientemente bem enquadrada para capitalizar as forças destes projectos. A razão, porém, da junção destes títulos deve-se ao trabalho contínuo e cada vez mais consolidada, inclusive em plataformas internacionais, de Amanda Baeza. Duas destas publicações são exclusivamente da sua responsabilidade, ao passo que outras duas contêm trabalhos seus. (Mais) 

25 de janeiro de 2016

Chantier Interdit au Public. Claire Braud e Nicolas Jounin (Casterman)

Este é o primeiro volume de uma nova colecção intitulada Sociorama, que parece vir a ser dedicada a projectos de banda desenhada que procurem adaptar, basear-se ou dialogar com trabalhos académicos em torno de questões sociais, sejam relatórios, inquéritos ou mesmo dissertações. Pelo que entendemos, os “temas” na calha rondam a indústria de cinema pornográfico, as profissões afectas aos voos comerciais e as práticas dos “sedutores de rua”. A colecção é dirigida por Lisa Mandel, uma autora que tem aliado a banda desenhada humorística a temas socialmente relevantes, tocando sempre as raias da realidade francesa contemporânea, e Yasmine Bouagga, uma investigadora do prestigiado CNRS. Este livro, apesar do seu público, escancara na verdade os portões de um estaleiro de construção civil e da realidade social que acalenta, mas oculta. (Mais) 

23 de janeiro de 2016

Sam Zabel and the Magic Pen. Dylan Horrocks (Knockabout)

A expectativa pessoal em relação a este novo livro do autor neo-zelandês era, na verdade, muito grande, uma vez que continuamos a considerar Hicksville (1998) uma pequena conquista na modernidade da banda desenhada internacional, e um verdadeiro gesto para criar pontes fortes entre as várias tradições nacionais num só contínuo. Além disso, Horrocks é um autor que tem dedicado algum tempo à reflexão sobre a sua própria arte, tendo fornecido alguns argumentos sólidos em relação, por exemplo, à problemática ahistoricidade da primeira obra de McCloud. Estes factores são importantes, uma vez que continuam a alimentar Sam Zabel, se bem que para resultados bem diversos. (Mais) 

21 de janeiro de 2016

Bagatelas: treze pequenos livros e fanzines. AAVV

Mesinha de Cabeceira # 27. XXXMas Special: Nadja, Ninfeta Virgem do Inferno. Nunsky (Mmmnnnrrrg) Depois de um tremendo intervalo entre os dois livros acabados do bravio autor do norte, eis que Nunsky regressa às lides rapidamente com um pequeno opúsculo. Mas todos os instrumentos são bem diversos dos de Erzsébet: a história completa que ocupa todo o número 27 do MdC é, a um só tempo, pesada e leve, séria e cómica, fresca e desesperante. A ninfeta do título vê o seu jovem namorado toxicodependente a perder a vida com um chuto mal-sucedido, e segue-lhe na peugada até ao Inferno, onde faz um pacto com o demónio que a torna numa personagem trágica e romântica. Ser-lhe-á concedido tempo de redenção com o namorado quantas mais almas conquistar para o Príncipe das Trevas. Este relato parece prometer-se como o primeiro episódio de muitas aventuras, e seguramente que haveria estômago para aguentar tamanha crueldade, morte sanguinária, heavy metal à anos 1980, e risadas à custa de beatos de séries de televisão de cartão canelado de décadas ainda mais rebuscadas. Um autêntico exercício de citação de bonecos-feitos, Nadja é, em termos figurativos, uma espécie de clash entre a luxúria e os laivos de fotorrealismo ma non troppo de um de Will Elder ou Angus McKie (e, no que diz respeito às cores, a explosão de diversidade do segundo e a o esbatimento do segundo, sobretudo na fase da Playboy, com H. Kurtzmann) e o pormenor quase doentio nas expressões e distribuição de moral, e até alguns aspectos do conteúdo, de Jack Chick (das “Chick Bibles”). Existem traços de alguma soberba crença na mundividência católica e a associada crença no Demo. Tratar-se-á este Nadja de um tortuoso panfleto de um Católico atormentado por gostar dos discos dos Slayer e Iron Maiden e querer ver realizadas as suas capas? Uma homenagem a todo um historial de comics de séries Z? Interprete-se como se desejar, e para mandar fora um cliché, Nadja é um bafejo de hálito quente e cerveja quente. 
(Mais)

20 de janeiro de 2016

23 de Janeiro: Mesa-redonda no Museu Bordalo Pinheiro.

Serve o presente post para convidar todos os interessados em estarem presentes na sessão aqui indicada, no próximo Sábado, pelas 17h, no Museu Bordalo Pinheiro. Este evento está relacionado com a exposição patente na Bedeteca da Amadora, de que falámos aqui, e é trabalho de uma colaboração entre instituições que se espera possa vir a continuar noutras frentes e/ou iniciativas. 

Esperamos que a conversa seja diversificada nas suas dimensões e produtiva nos pontos de contacto. 

Contamos convosco!


18 de janeiro de 2016

Café Royal. Sean Murphy et al. (Essential Sequential)

Este livro é fruto de um programa intenso e curioso organizado por Sean Murphy e a sua mulher, Katana Collins, em que o famoso artista recebeu cinco autores de banda desenhada durante umas semanas no que parece ter sido um Inverno rigoroso, e onde se esgrimiriam não apenas técnicas artísticas como igualmente questões associadas ao lado comercial e negocial desta actividade. Todos estes autores não são amadores nem recém-chegados, mas antes pessoas que já deram provas das suas capacidades artísticas e de trabalho, mas que nesta experiência com um profissional de primeira água e muito solicitado no mercado norte-americano seguramente aproveitaram sinergias e conselhos insubstituíveis. Esses formandos foram Tana Ford, Corin Howell, Joe Dellagatta, Clay McCormack e o autor português Jorge Coelho, no fundo a razão pela qual adquirimos este volume. (Mais) 

17 de janeiro de 2016

A casa que voou/A sereia e os gigantes. Davide Cali e Catarina Sobral (Bruáa/Orfeu mini)

Graças à recepção do seu trabalho, celebrado pela crítica, leitores, exposições e prémios, mas igualmente por uma intensidade concentrada de trabalho efectuado, Catarina Sobral consegue produzir novos projectos no que parecerá tempo recorde. Eis mais dois títulos a somar a uma das autoras mais produtivas, em termos individuais, da literatura ilustrada infantil portuguesa, que vêm mostrar ainda mais desdobramentos da sua assinatura visual e autoral. Em ambos os casos, podemos dizer que se Catarina Sobral optou por não escrever as palavras, a matéria narrativa e até os elementos que compõe aquilo a que chamamos de “história”, está porém nas suas mãos o enquadramento da matéria visual em torno desses mesmos elementos, assim como toda a organização dos ritmos, objectos e conjunção de tudo aquilo que concorre para a construção do significado, quer aquele paulatino, página a página, quer o total. (Mais) 

16 de janeiro de 2016

Talco de vidro. Marcello Quintanilha (Polvo)

A equação deste novo livro de Quintanilha apresenta uma estrutura curiosa, e que demonstra o quão mais importantes são as construções das pessoas nas nossas próprias mentes, misturando factos e contacto directo com projecções, medos e ansiedades do que um verdadeiro encontro entre duas pessoas num palco de igualdade. Se Talco de Vidro parece ter duas personagens a viverem numa qualquer relação de distribuição e troca de energias, a verdade é que é apenas a partir de uma delas que todos os novelos da trama são despedidos, e é totalmente na responsabilidade dessa personagem que recaem as forças que desenrolarão, desfiarão e destruirão esse mesmo novelo. (Mais) 

15 de janeiro de 2016

Sorge, o espião. Isabel Kreitz (Veneta)

Richard Sorge é uma personagem histórica. O traço que o inscreveria na história é o facto de ter sido espião alemão do Império Soviético desde o final dos anos 1920, infiltrando-se nos círculos nacionais-socialistas logo na década de 1930 e, depois, tornando-se o responsável pela rede de informação no Japão. Enquanto membro do Partido Nazi, jornalista alemão e confidente do embaixador alemão em Tóquio, a sua capacidade de trabalho e de acesso a informações confidenciais permitir-lhe-ia o seu maior feito: partilhar dados sobre a invasão alemã da União Soviética em 1941 o que, aparentemente, terá ajudado à derrota dos Nazis nessa empreitada. É bem possível que este último episódio, que o tornaria um traidor e o levaria à captura e execução pelos poderes do Eixo, Alemanhã-Japão, mas igualmente e muito mais tarde o tornaria um herói aos olhos da Rússia, seja bem mais complexo do que uma breve entrada enciclopédica ou mesmo uma versão romantizada (sob a forma de banda desenhada, romance ou filme) possa dar conta, mas é isso o que lhe atribuiria fama póstuma, ao ponto de ser considerado “o maior espião de todos os tempos” por escritores do género como Ian Fleming e Tom Clancy. (Mais) 

14 de janeiro de 2016

VERBD. Episódio 5.


E para finalizar, aqui têm o 5º e último episódio do documentário Verbd
Este episódio acaba por ter uma qualidade ligeiramente mais ensaística, académica e metódica: falamos dos próprios processos de memória e herança na banda desenhada portuguesa, da forma como esta disciplina começa a ganhar maiores instrumentos de cultura própria, dedicamos um grande bloco a algumas das experiências de ensino de banda desenhada (o antigo CIEAM, o Ar.co, o então jovem curso da ESAP-Guimarães, e finalmente fazemos algumas considerações autorais sobre o que se tentou responder com a série documental e uma consciência clara do que ficou de fora. Claro, damos também a palavra aos nossos autores, de maneira a terminarem com ideias próprias e estimulantes. 

Episódio 1.
Episódio 2.
Episódio 3.
Episódio 4.

E pronto, chegamos ao fim. Partilhem, copiem, projectem onde puderem. Obrigado por tudo. 

Vamos ao próximo?

Nanjing: The Burning City. Ethan Young (Dark Horse)

A intriga deste livro está tão enclausurada quanto os soldados que acompanhamos: o Capitão (cujo nome jamais diz, nem confessa quando é capturado, tornando-o uma cifra para muitos dos heróis da guerra) e o soldado raso Lu, na cidade derrubada de Nanquim ou Nanjing. Estamos no final de 1937, no auge da 2ª Guerra Sino-Japonesa (que desagua, qual rio, no oceano da 2º Grande Guerra). A cidade já foi bombardeada severamente pela aviação japonesa, uma sua parte foi tornada uma “zona segura” para refugiados civis e estrangeiros (sobretudo os ocidentais que haviam igualmente contribuído para minar a própria estrutura económica e social da China desde o século XIX), e a infantaria japonesa procede a um saque, morticínio e violações em massa tão atroz (apesar do negacionismo japonês até à data), que todo o episódio é conhecido muitas vezes por “A violação de Nanquim”. É portanto na paisagem dessa barbárie e desolação, e no colapso e abandono total pelas chefias e organização militar da cidade, que o Capitão e Lu se encontram isolados, e tentam escapar, conquistando a passagem rua a rua, da cidade e dos perigos que os esperam às mãos dos militares japoneses. (Mais) 

13 de janeiro de 2016

O que vemos quando lemos. Peter Mendelsund (Elsinore)

Parece haver um entusiasmo partilhado por muitos leitores em torno deste livro de Peter Mendelsund, o qual se justifica na medida em que é um livro “ao quadrado” mas com outras anfractuosidades muito em voga. O “quadrado” é o facto de se tratar de um livro sobre livros, sobre a leitura dos livros, sobre o prazer, expectativas e até mesmo perigos que ocorrem nela; as outras dimensões espraiam-se por considerações sobre as fantasmagorias visuais desenvolvidas à medida da leitura, o grau de co-criação a que o leitor se propõe com determinado livro, na capacidade dos autores de dirigirem de uma forma ou outra a matéria “visualizável” dos seus escritos. Outro domínio pelo qual o livro tem suscitado algum entusiasmo é pela forma como se apresenta materialmente, as características da edição, as suas profusas ilustrações, uma paginação leve, rápida, com grandes letras, ou palavras isoladas, etc., que torna o acto de leitura deste livro bastante rápido. Porém, O que vemos quando lemos é igualmente um caso de mal-entendidos e de caminhos mais prometidos do que trilhados. (Mais) 

11 de janeiro de 2016

Vive la marée ! David Prudhomme e Pascal Rabaté (Futuropolis)

Como noutras sociedades ocidentais, a francesa e a portuguesa entende bem o que significa do fluxo migratório dos corpos dos cidadãos urbanos rumo à beira-mar por altura das férias de Verão… Todavia, grande parte das pessoas sabe igualmente que esse prazer prometido encerra em sim mesmo um bom número de escolhos – filas de trânsito, combates em busca de espaço suficiente no areal, refeições que correspondam ao sonhado, um convívio mais apertado que o costume com os membros da família, a difícil instalação de rotinas passageiras, etc. – mas que se enfrentam na ideia de que, ultrapassados, se desvendará a Terra Prometida: o Descanso. Vive la marée! não é de forma alguma o hino a essa aventura, com o tom heróico e positivo que isso pareceria acarretar: é antes a constatação da patetice desses mesmos obstáculos. (Mais)

10 de janeiro de 2016

Gris/Cinzas. Olivier Schrauwen (Arbitraire /Mundo Fantasma-Mmmnnnrrrg)

Como dissemos atrás, Cinzas é um livro que nos apresenta um enquadramento autobiográfico. Diríamos mesmo que hiperbolizado na sua forma material. Mas para isso é preciso descrever rapidamente essa mesma forma. Originalmente publicado em língua inglesa, e em offset (edição que não conhecemos), o autor viria a republicar este título em francês numa pequena edição, quase num formato de bolso, com lombada, em risografia a preto e cinzentos com uma capa serigrafada. A edição em português, pela Mundo Fantasma e a Mmmnnnrrrg também é em risografia, se bem que mais próxima de um caderno escolar, até por deixar visível linhas paralelas, e em quatro cores: azul, verde, vermelho acastanhado e um laranja “psicadélico” (que foi aquele que obtemos). Na edição francesa aparece o rosto do avatar do autor, sob a forma de um trintão algo forte, com umas imensas entradas nas têmporas e de ar ligeiramente imbecil. A edição portuguesa coloca na sua capa uma das primeiras partes do prólogo exclusivamente textual, transformando em parte o contrato de leitura da obra. (Mais)

D’ailleurs. Alain Munoz (Habeas Corpus)

Apesar de falarmos em dois posts diferentes deste livro e do de O. Schrauwen, lemo-los em conjunto, por duas razões, a jusante a montante dos textos em si. A primeira razão prender-se-á de uma oportunidade falhada por pouco, mas que criou as circunstâncias para adquirir ambas as publicações (em francês) ao mesmo tempo no mesmo local. Ambos os autores são belgas – um francófono e o outro flamengo - e é natural que ocorram encontros naquele país nas mesmas plataformas. A segunda deve-se ao facto de ambas serem, pelo menos na sua camada mais superficial, gestos epistolares. (Mais)

9 de janeiro de 2016

Amigos do peito. Cláudio Thebas e Violeta Lópiz (Bruaá)

Numa correria da escola até casa, uma personagem visita vários dos cantos da cidade onde vive, perscrutando espaços de naturezas específicas, que convidam a actividades díspares, sempre na companhia de um seu amigo próximo. Esse passeio, que podemos imaginar repetido todos os dias, é também palco de uma reflexão sobre a amizade, ou melhor, a possível definição de um amigo, alguém que conhecemos por uma razão qualquer que nos leva a colocá-los num lugar que podemos sempre revisitar. (Mais) 

8 de janeiro de 2016

The Care of Birds. Francisco Sousa Lobo (Chili Com Carne)

Em Os irmãos Karamazov, Dostoievsky escreve “Um homem que mente a si mesmo e que escuta a sua própria mentira chegará a um ponto em que não distinguirá a verdade nele mesmo ou à sua volta, e perderá então o respeito por si mesmo e pelos outros. Sem respeito não poderá mais amar, e para se ocupar e se distrair, sem amor, abandona-se nas paixões e em grosseiros prazeres, afundando-se na condição animal dos seus vícios, efeito da mentira incessante aos outros homens e a si mesmo” [péssima tradução nossa, sem desculpas, via edição em inglês]. (Mais)

6 de janeiro de 2016

Estúpidos, maldosos, belos: alguns livros e uma exposição em torno do “Charlie Hebdo”. AAVV

Fará amanhã um ano desde que o ataque levado pelos irmãos Kouachi (que os Profeta lhes cuspa nas tumbas) mataram os artistas Charb, Honoré, Tignous, Cabu, e Wolinski, os membros da redacção Elsa Cayat, Bernard Maris, Mustapha Ourrad e Michel Renaud, o guarda-costas Franck Bronsolato, o segurança Frédéric Boisseau e o agente da polícia Ahmer Merabet. Com vista a assinalar essa data, mas de forma alguma desejando cair na tentação da homenagem emocional, ou em questiúnculas irresolúveis como a compatibilidade do regime democrático e os princípios inerentes à Revolução Francesa com quaisquer dogmas religiosos, as contradições de um discurso que compactua com categorias facilitistas e maniqueístas de um “eu” e um “eles”, ou sobre os “limites” e o papel do humor, da sátira e, até mesmo, da brejeirice ordinária, preferimos tão-somente olhar para a produção efectiva de toda a família associável a esse título. (Mais) 

4 de janeiro de 2016

Fósseis das almas belas. Mário Freitas e Sérgio Marques (Kingpin Books)

Poder-se-á descrever Fósseis como tendo três “partes”. A linha principal da narrativa é a de uma família, a saber, Samuel e os seus dois filhos, Marco e Valéria, passando as férias na praia da Adraga: parte do folclore local (as formações rochosas com os seus apodos), as brincadeiras da filha e os conhecimentos do pai concorrerão para criar uma história de encantar (e assustar). Desse relato desprende-se a vida do rei D. João II e a exploração da costa africana, podendo mistificar-se nessas missões a “Época de Ouro” das navegações dos portugueses – os focos principais são o assassinato do Duque de Viseu e a viagem de Bartolomeu Dias. Finalmente, uma terceira linha é a mítica, e tríplice: não apenas aquela “mito-histórica”, associada à viagem e “dobragem” do cabo das Tormentas/da Boa Esperança, mas igualmente a camoniana (o mito do Adamastor) e uma mais original, fantasiosa (uma série de criaturas fantásticas, aliadas e antagonistas de Adamastor). (Mais) 

2 de janeiro de 2016

In God We Trust. Winshluss (Knockabout)

Nalguns dos episódios aqui incluídos, Winshluss pede emprestado as personagens do Super-Homem e de Conan, o Bárbaro. Numa nota final do volume, ele indica a atribuição aos seus autores respectivos, mas acrescenta que infelizmente não pode citar os autores de todas as outras personagens (Deus, Jesus, Moisés, Pôncio Pilatos, etc.), pois não os descobriu. Sendo assim, a ficção prossegue. (Mais) 

1 de janeiro de 2016

Space Dumplins. Craig Thompson (Scholastic)

Este título está, na obra de Craig Thompson, mais próximo de um dos seus primeiros longos trabalhos, Good-bye, Chunky Rice, provavelmente ainda um dos seus melhores trabalhos, não obstante o sucesso crítico e de exposição de Blankets e o estranho ruído de Habibi. Porém, Space Dumplins parece-nos ser dedicado a um público ainda mais jovem, digamos na passagem da infância para a adolescência. Trata-se de uma pequena saga familiar espacial, em que a jovem Violet Marlocke se perde de ambos os pais, e se lança numa missão de resgate apenas acompanhada pelos seus dois novos amigos, também miúdos, Zacchaeus, um dos últimos descendentes dos Lumpkin (mas excepção dessa espécie, atarracado e irascível), e Elliot, uma pequena galinha-rapaz – não é erro – descendente de galináceos artificialmente humanizados -, sensível, e mais dado às questões do espírito que aos da acção. (Mais)